sábado, 22 de agosto de 2009

Pérolas da Mitologia - Momento Mágico

(Afrodite de Knidos, Praxiteles - Museu do Vaticano - Galeria das estátuas)
Frinéia, uma simples cortesã, galgou a galeria dos personagens inesquecíveis do antigo mundo grego, ao lado de filósofos, poetas e grandes estadistas. Ela era especial, pois, ao contrário das outras, que passeavam com túnicas transparentes para mostrar os detalhes do corpo, Frinéia usava um manto comum para manter sua beleza escondida dos olhares indiscretos. A ninguém, a não ser para os íntimos, mostrava seus braços ou seus ombros magníficos, e jamais frequentou os banhos públicos, hábito tão em voga naquela época. Mas um dia, durante as grandes festas dedicadas a Posêidon, diante de milhares de participantes vindos de todos os pontos da Grécia, ela avançou no meio da multidão reunida junto à praia e ali, no ponto em que o mar encontra a areia, sem dizer palavra, deixou cair o manto a seus pés e entrou lentamente na água, completamente nua, a não ser pelos longos cabelos soltos que caiam até os quadris. Entre os espectadores maravilhados, estava Praxíteles, o mestre escultor de Atenas, que imortalizou aquela visão quase divina ao trasnspor as formas de Frinéia para o mármore polido da famosa estátua de Afrodite, tornando-se o primeiro escultor a desnudar completamente o corpo da mulher.
Antes dele, tanto as deusas como as simples mortais apareciam sempre vestidas e os artistas mais ousados se limitavam a representá-las usando vestes molhadas, coladas ao corpo, para realçar suas formas. Praxíteles, com sua Afrodite, inspirado em Frinéia, fixou o modelo quase definitivo de nu feminino na arte ocidental, o da vênus pudica, ou seja, da mulher que tenta esconder sua nudez ao ser surpreendida sem roupa. Mais tarde, numa variante do que fez o escultor, encontramos no "Nascimento de Vênus", do pintor Boticelli, em que Vênus(como Afrodite era chamada pelos romanos), cruza um braço à sua frente para ocultar os seios, enquanto mantém o outro baixo, de modo a deixar sua mão escondendo o púbis, numa atitude que, como se vê, atrai nosso olhar exatamente para os pontos que estão sendo escondidos.
Não foi por acaso que a posteridade elegeu a Afrodite de Praxíteles como o símbolo do pudor, esse ingrediente indispensável para existir o erotismo. Afinal, ela era a deusa do amor e devia entender muito bem que sem a luz não existe sombra, e que, sem esse jogo tão feminino de esconder o que depois vai mostrar, todos nós - homens e mulheres - não conheceríamos aquele momento mágico de transgressão e de vertigem em que o manto de Frinéia finalmente cai no chão.

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