sexta-feira, 3 de junho de 2011

Pérolas Gregas - Nada está predeterminado




Na Grécia antiga vinham pessoas de todas as partes para consultarem Delfos, famoso oráculo que era assistido pelo próprio Apolo, o deus da profecia. Os gregos acreditavam que os oráculos eram representantes divinos. Porém as mensagens eram sempre obscuras ou incompletas, quase sempre com dupla interpretação. Isso foi confirmado por Creso, rei da Lídia, que adquiriu fama no mundo antigo por seu lamentável equívoco. Tomado pela obsessão de conquistar a Pérsia, foi a Delfos perguntar qual eram suas chances de vencer.

Diante da resposta do oráculo: “ Se Creso atacar a Pérsia, fará um grande império cair”, encheu-se de entusiasmo, reuniu seus exércitos e invadiu a Pérsia, sendo fragorosamente derrotado. Mas sobreviveu e, anos depois, foi a Delfos reclamar, sendo por este repreendido: se tivesse perguntado que império cairia, ficaria sabendo que era o seu. E não teria empreendido aquela campanha absurda.

Mais tarde, quando os persas marcharam sobre a Grécia, foram tomando uma a uma todas as cidades gregas em seu caminho. Os atenienses percebendo que seriam as próximas vítimas, consultaram Delfos para saber o que deveriam fazer. Nunca o oráculo foi tão claro: “Fujam para bem longe, enquanto é tempo, porque o fogo vai deixar suas casas e templos em ruínas”. Apesar do pânico provocado por tais palavras, fizeram uma nova consulta: ou recebiam uma previsão mais otimista ou ficariam ali para sempre, nas escadarias de Delfos, até morrerem de fome e de sede. Aquela colocação foi convincente, pois o oráculo acabou revelando que ainda era possível salvar a cidade, desde que confiassem “nos muros de madeira” – que os atenienses interpretaram como o casco de madeira dos navios que tinham acabado de construir. Então atraíram os persas para um combate naval e os derrotaram perto de Salamina.

Se Apolo nunca é tão preciso quanto alguns gostariam,é porque ele conhece o segredo supremo que rege a nossa existência: nada é predeterminado. O velho filósofo Heráclito foi o primeiro a compreender esse fato: o deus que fala em Delfos não revela nem esconde a verdade – ele apenas a aponta. O resto é o homem que escolhe.

Creso poderia ter feito a pergunta que não fez, e os mensageiros poderiam ter voltado para Atenas sem insistirem na consulta – mas eles próprios elegeram seus destinos. É como ensina a velha imagem do cone e do cilindro a beira de um plano inclinado: mesmo que ambos recebam impulso idêntico, eles vão descer a rampa de maneira diferente. Assim somos nós. Os fatos estão aí, na sua realidade objetiva, mas a reação que eles provocam vai depender do caráter de cada um. Na curta ladeira da vida, uns vão descer como cones, outros como cilindro, mas tudo depende de nós. Os deuses só observam.

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